PEC da Dosimetria foi revide à blindagem ao STF

Quando o Congresso tenta enquadrar a Justiça para proteger a si mesmo

PEC da Dosimetria foi revide à blindagem ao STF

A chamada PEC da Dosimetria não surgiu do acaso nem de um súbito zelo do Congresso Nacional pelo equilíbrio institucional. Ela é, antes de tudo, um revide político — calculado, simbólico e perigoso — àquilo que parte dos parlamentares passou a chamar de blindagem absoluta do Supremo Tribunal Federal.

Nos últimos anos, o STF deixou de ser apenas guardião da Constituição para assumir, aos olhos do Congresso, o papel de protagonista político. Decisões monocráticas com efeitos nacionais, interferências diretas em atos do Legislativo e interpretações elásticas da Constituição criaram um ambiente de tensão permanente entre os Poderes. A dosimetria das penas, sobretudo nos julgamentos ligados aos atos antidemocráticos, tornou-se o estopim.

A PEC tenta impor limites ao Judiciário sob o argumento de garantir proporcionalidade e individualização das penas. No discurso oficial, trata-se de justiça. Na prática, porém, o texto carrega a marca da retaliação. Parlamentares que se sentiram acuados, investigados ou ameaçados por decisões do STF encontraram na dosimetria um flanco sensível para reagir.

O problema é que essa reação não é institucional; é corporativa. Ao invés de buscar o diálogo republicano ou a correção de excessos por meios constitucionais adequados, o Congresso opta por um atalho perigoso: enfraquecer o Judiciário para se proteger. Não é coincidência que a PEC ganhe força justamente quando ministros do Supremo passam a decidir com rigor contra aliados políticos, financiadores e operadores do poder.

A dosimetria das penas é matéria técnica, jurídica, construída caso a caso, não um instrumento para barganha política. Quando o Legislativo tenta engessar o Judiciário por meio de emenda constitucional, o que está em jogo não é apenas a pena de A ou B, mas a própria separação dos Poderes.

A PEC da Dosimetria, portanto, não é um avanço democrático. É um recado. Um aviso de que, se o STF não recuar de sua posição de enfrentamento, o Congresso está disposto a usar sua caneta constitucional como arma. Trata-se de uma escalada institucional que fragiliza a democracia e expõe o país a um jogo de forças onde a Constituição vira refém dos humores políticos.

No fim, quem perde não é o Supremo nem o Congresso. Perde o cidadão, que assiste a mais um capítulo da guerra entre Poderes enquanto temas urgentes — saúde, educação, fome e segurança — seguem relegados ao segundo plano. A PEC da Dosimetria não busca justiça; busca vingança política travestida de legalidade.

Creditos: Professor Raul Rodrigues