Consequências da Irresponsabilidade na Segurança Pública

Consequências da Irresponsabilidade na Segurança Pública

Irresponsabilidade assassina!

Coronel Paganotto, colunista do iG, com mais de três décadas dedicadas à segurança pública, iniciou sua formação na Escola de Cadetes do Exército e, em seguida, na Academia Militar do Barro Branco. Sua trajetória inclui o comando de patrulhamento tático e territorial nas zonas sul e norte de São Paulo, além de passagens por unidades de elite como a ROTA (5 anos), o Comando de Operações Especiais e uma missão de dois anos infiltrado no sistema prisional. Por 12 anos, liderou o Policiamento Rodoviário no litoral de São Paulo e no sistema Anchieta-Imigrantes. É Doutor em Ciências de Segurança Pública e Bacharel em Direito com especialização em Processo Penal. Em 2025, assumiu a Secretaria de Segurança Pública do Município de Monte Mor - SP.

Quem são os verdadeiros responsáveis pelas mortes na Operação Carioca? Não se trata uma doença crônica utilizando apenas medicações que amenizam os sintomas. Longos períodos de omissão governamental e decisões favoráveis ao crime organizado tomam conta do corpo todo, causam deficiências generalizadas e, ainda assim, não faltam “médicos” superficialistas aproveitadores do caos. Diferentemente das figuras cômicas lastreadas em títulos acadêmicos e desconectadas da realidade das ruas, todos os policiais operacionais possuem o conhecimento de que antecedentes criminais não refletem as personalidades do outro lado das trincheiras. Nem mesmo o tão falado “DVC”(pesquisa nos bancos de dados policiais) tem tamanha luneta. A diferença entre as duas ferramentas está basicamente ligada ao princípio constitucional na presunção de inocência. Enquanto o atestado de antecedentes criminais traz apenas os casos em que o indivíduo conseguiu, diga-se de passagem, com muita habilidade, receber uma sentença condenatória sem possibilidade de recursos, no “DVC” será possível verificar os inquéritos que por ventura o cidadão tenha respondido.

Não há nesses registros a vida de crimes praticados até completar a maioridade penal, nem todas as demais condutas praticadas sem que tenha havido uma prisão. Mesmo diante de toda essa fragilidade cadastral esse tema tomará relevância ao fim desta coluna. A perturbação de sossego é uma ação criminosa insuportável, mas bem menos violenta, porém guarda uma lógica interessante com o que ocorre no Rio de Janeiro. Todos os gestores de policiamento ostensivo em São Paulo procuram mapear os locais de instalação dos bailes funk e planejam ocupação territorial, acionamento dos demais órgãos de fiscalização de licenças e, antes mesmo que o evento se inicie, a área estará dominada. A lógica citada não cabe no cenário carioca em razão de diversos fatores.

A cultura de empoderamento do traficante dono morro, ladeado por um exército armado de fuzis e granadas, que controla todos os serviços e julgamentos da comunidade, promove eventos prestigiados por estrelas e autoridades, cria um território impossível para ações de segurança pública, deixando apenas a alternativa do combate urbano. A ausência de enfrentamento do status quo impulsiona os ganhos, aquisições bélicas e o fomento da defesa da simbiose local. Ano após ano, o gigante criminoso cresce e vai ampliando sua área, sentindo-se tão seguro e corajoso que passa a habitar onde já não é morro. A sociedade que ainda não foi sodomizada assiste horrorizada a impotência ou conivência. De forma silenciosa, um exército menor, mas muito vocacionado, cheio de informações, vai construindo planos para tentar reverter o caos e, dependente de vontade política vai suplicando pelas escolhas corretas.

Eis que, de forma surpreendente, um político corajoso, resolve dar o primeiro passo ao combate urbano e recado de frenagem aos líderes de organizações criminosas do Estado. Qualquer filme da chegada das tropas aliadas na Normandia consegue rapidamente explicar as consequências do avanço de tropas embaixo de rajadas e granadas. Antes que pensem que o conteúdo é tendencioso, veja você mesmo a imagem de dois traficantes camuflados despejando rajadas com fuzis de uma posição alta da comunidade, sem qualquer preocupação com moradores inocentes.

Como coluna não é livro e nem tese, voltaremos aos antecedentes para encerrar a reflexão. Decência e eficiência pública é medida pelo que é feito antes de uma tragédia, não nos holofotes sustentados pelo sofrimento alheio. Quando muitos deveriam estar cavando buracos para enfiar suas caras mal lavadas cheias de omissões diárias, se unem para caçar nos corpos enfileirados, um que não tenha qualquer registro de crime antecedente e, como tal, possa habilitar a narrativa da operação desastrada. Não se iluda! A cura do câncer passa pela ingestão de medicação destrutiva celular. Não há vitória fácil, o Rio de Janeiro um dia voltará a ser completamente lindo se houver a união das forças do bem.