Quando o derrotado culpa o povo pela própria cegueira
16/10/2025, 09:37:19A arrogância política de quem perdeu e não aprendeu com a derrota
Há uma frase que costuma se repetir após cada eleição: “O povo não soube votar.” Ela sai, quase sempre, da boca dos derrotados — especialmente daqueles que, no fundo, se achavam imbatíveis. É o lamento travestido de superioridade moral, o último discurso de quem não consegue admitir que a urna fala mais alto do que a vaidade.
Quem já perdeu uma eleição e afirma que foi porque “o povo não enxergou” comete dois erros graves: o primeiro, político; o segundo, humano. O erro político está em desprezar a soberania popular — base da democracia. Já o erro humano está em recusar o espelho, pois é nele que se vê o verdadeiro motivo da derrota.
O eleitor pode até errar, mas não é cego. Ele enxerga, e muito. Enxerga promessas não cumpridas, discursos vazios, alianças duvidosas e comportamentos incoerentes. Enxerga quando o candidato aparece só em época de eleição, quando trata a política como herança familiar ou quando tenta comprar prestígio com festas e favores.
Dizer que “o povo não enxergou” é uma forma de disfarçar o fracasso. É transformar o orgulho ferido em arrogância. O político maduro entende que eleição se perde por falta de diálogo, por distanciamento da realidade, por ter se tornado refém de um grupo ou de um ego. Já o político pequeno prefere culpar os outros — inclusive o povo — por sua própria miopia.
O eleitor, por sua vez, continua vendo tudo. Talvez não fale, talvez não poste, mas observa. E na hora certa, responde com o voto. A verdadeira cegueira não está no povo — está em quem insiste em olhar o mundo político pelo espelho retrovisor da vaidade.
Em política, perder não é o fim. Mas culpar o povo pela derrota é o caminho mais rápido para nunca mais voltar a vencer.