William Browder critica sanção contra Alexandre de Moraes
03/08/2025, 15:33:29
William Browder e as sanções ao STF
O britânico William Browder, responsável por liderar a campanha que criou a Lei Magnitsky, classificou como uma "violação grosseira" a decisão do governo Donald Trump de sancionar o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. Em entrevista ao UOL, Browder afirmou que, caso Moraes recorra ao Judiciário americano, deve sair vencedor.
Na semana passada, o governo dos Estados Unidos incluiu Moraes na lista de pessoas sancionadas pela lei, que autoriza o congelamento de contas e o bloqueio de bens em solo norte-americano. Browder afirma que a medida foi tomada por "motivos políticos óbvios" e que não existem indícios que justifiquem esse enquadramento.
“O uso da lei Magnitsky pela administração de Trump é uma violação grosseira. Está sendo feita por motivos políticos óbvios, não há nenhuma alegação que eu saiba de que o ministro esteja envolvido em tortura ou corrupção em grande escala. Pelo que li, parece muito claro que Donald Trump e outros estão bravos com ele [Moraes] por ele estar processando o ex-presidente brasileiro [Jair Bolsonaro, réu por tentativa de golpe de Estado].”
A Magnitsky e suas implicações
A Magnitsky foi criada para punir violações graves de direitos humanos, mas, segundo Browder, esse não é o caso de Moraes. Ele afirma que nem mesmo as acusações mais graves feitas contra o ministro — como ter determinado a retirada de perfis do Twitter ou restringido liberdade de expressão — justificariam a sanção.
“Essa lei não foi feita para resolver disputas políticas. Foi feita para ajudar as vítimas de grandes violações de direitos humanos. [...] Não vi nenhum outro caso em que a lei foi mal utilizada assim.”
“Sou especialista na Lei Magnitsky. Não sou especialista no Brasil ou nesse juiz em particular. E o que posso dizer é que não é preciso ser especialista, as alegações que adversários [de Moraes] fizeram contra ele não estão no nível de sanção pela Lei Magnitsky. Se você pegar a acusação mais séria, a de que ele derrubou [contas do] Twitter, de que não acredita em liberdade de expressão... essas coisas não são sancionáveis pela Lei Magnitsky.”
A importância da revisão judicial
Browder explica que a lei prevê a possibilidade de revisão judicial justamente para evitar abusos. Até hoje, essa possibilidade nunca havia sido usada, pois os casos sancionados eram claros. Para ele, Moraes pode ser o primeiro a conseguir reverter uma sanção.
“A lei permite uma revisão jurídica. Até o momento, ninguém nunca contestou as sanções porque eram casos claros de violações. Neste caso, acredito haver uma chance real para que Moraes faça um apelo à Justiça, dizendo que esse é um uso errado da lei.”
“O governo Trump está usando mal esta e várias outras leis, e tem perdido recursos na Justiça em 96% dos casos. Eles estão realmente se comportando como cowboys em relação à lei.”
“Se tiver um caso em que a contestação da lei Magnitsky fará sentido, este [de Moraes] é um deles. Se ele for à Justiça, acho que ele vencerá.”
O legado de Sergei Magnitsky
Browder, que foi um dos principais investidores estrangeiros na Rússia, perdeu o advogado Sergei Magnitsky, que descobriu um desvio de US$ 230 milhões em impostos pagos pela empresa do britânico. Magnitsky foi preso e morreu menos de um ano depois, em 2009. O governo russo atribuiu a morte a insuficiência cardíaca, mas organizações de direitos humanos denunciaram que ele foi espancado até a morte.
“Eu fiz um voto à memória dele [Magnitsky], à família dele e a mim mesmo de que haveria justiça. E isso não era possível na Rússia, onde o governo estava completamente envolvido no crime e em sua ocultação. Quando eu fui pesquisar como poderia conseguir justiça fora da Rússia, vi que não havia nenhum mecanismo legal.”
“E se não havia, então eu teria de criar um. Pensei em como eu poderia acabar com a impunidade para torturadores e assassinos como os que mataram Sergei, e tive a ideia de congelar seus bens e banir suas viagens, que levei ao Congresso americano. [...] Foi isso que se tornou a lei global Magnitsky, aprovada em 2012 e ampliada em 2016.”
Desde que entrou em vigor, a lei foi usada para sancionar autoridades ligadas ao genocídio dos rohingya, em Mianmar, e policiais envolvidos na repressão de protestos na Nicarágua.
“Tenho medo de que, com o mau uso da lei Magnitsky, ela perca a credibilidade e pessoas envolvidas em genocídio ou assassinatos pensem que ela foi feita só para resolver disputas políticas -e não foi.”