O impresso resiste e continua a fazer história

O impresso resiste e continua a fazer história

Reflexões sobre a resistência do jornal impresso

No início dos anos 2000, a realidade financeira na minha casa ficou difícil. O aperto econômico levou meus pais a cancelarem a assinatura do jornal. Aquela foi uma fase complicada, especialmente porque eu me preparava para prestar vestibular para jornalismo no final de 2001.

Minha mãe, determinada, ligou para uma vizinha que era assinante de um tradicional diário impresso. Perguntou se ela teria planos para as folhas do jornal depois de lê-las. A resposta foi negativa; as páginas iriam para o lixo. Então, minha mãe se ofereceu para recolher as edições do dia anterior. Isso foi a sua forma de garantir que eu pudesse ler as notícias ao voltar da escola, geralmente à noite.

Era um processo curioso. As páginas começavam a ser escritas e apresentadas já na antevéspera, seguiam para a gráfica na madrugada, atravessavam o estado e, finalmente, chegavam até mim com a ajuda da vizinha. Com frequência, eu lia as notícias com até dois ou três dias de atraso, já quando a noite caía.

Durante esse período, aprendi a amar e valorizar o papel que segurava nas mãos. A preocupação com a precisão do noticiário não era meu único foco. Um jornal impresso é uma experiência que vai além das notícias frescas. É um passeio por territórios familiares, onde os nomes passam a fazer parte da nossa rotina.

  • As colunas e estreias que marcam o dia a dia.
  • Dicas de filmes, horóscopos e palavras cruzadas que compõem o cotidiano.
  • A experiência visual que o impresso proporciona, com soluções gráficas que ajudam a entender questões complexas.

Hoje, não preciso mais esperar a vizinha terminar de ler o jornal. Após passar no vestibular, já tive a oportunidade de trabalhar como repórter em jornais impressos, uma das melhores experiências de aprendizado que alguém pode ter.

Na redação, aprendemos que nem toda história é digna de ser impressa. É fundamental estar ciente da relevância de cada notícia, confrontar versões e checar os fatos antes de dar vida às histórias. Mais importante que o furo da matéria é a reputação do veículo de comunicação. A credibilidade é, sem dúvida, o oxigênio da prática jornalística.

Acompanhei de perto as transformações no ofício desde aqueles primórdios. Testemunhei o crescimento da era digital, a ascensão de blogs e a popularização de youtubers. Também vi bolhas de informações se formarem e, em pouco tempo, estourarem. Contudo, a essência do jornalismo verdadeiro permanece: os bons sobrevivem, enquanto os medíocres desaparecem.

Nesta quinta-feira, o jornal O Dia celebra 74 anos de história. Através de muitas intempéries, como a Guerra Fria, a ditadura e a redemocratização, o veículo sempre buscou destacar as pequenas grandes histórias de bairros esquecidos, promovendo a cultura popular e dando voz àqueles que historicamente foram silenciados.

A atuação fundamental do O Dia é vigiar, cobrar as ações do poder público e denunciar os abusos em uma sociedade repleta de desafios. Nesse mosaico, as pequenas grandes histórias se entrelaçam, sempre com uma visão respeitosa da História, com H maiúsculo.

*Este texto não reflete necessariamente a opinião do Portal iG.