Crescimento das Decisões Monocráticas no STF nos Últimos Anos
10/02/2025, 06:30:08![Crescimento das Decisões Monocráticas no STF nos Últimos Anos](https://correiodopovoal-cms.nyc3.digitaloceanspaces.com/uploads/42f90400cc368e1fd95c5029f4dcdaac.webp)
Levantamento sobre Liminares no STF
Levantamento feito pela Folha mostra que o número de liminares individuais em ADIs (ação direta de inconstitucionalidade) e ADPFs (arguição de descumprimento de preceito fundamental) foi de apenas 6 em 2007 e chegou a um pico de 92 em 2020. No ano passado, foram 71.
Concessão de Decisões Monocráticas
CÉZAR FEITOZABRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Para contornar a falta de espaço na pauta do plenário, os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) intensificaram a partir de 2009 a concessão de decisões monocráticas em ações de controle de constitucionalidade.
As liminares monocráticas são alvo de discussão há anos no Judiciário brasileiro. O Congresso Nacional aproveitou uma brecha para tentar impor um revés ao Supremo, com o avanço de uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que restringe o poder individual dos ministros do STF.
Reações do Congresso e da Sociedade
Os novos presidentes da Câmara e do Senado, Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), deram recados ao Supremo em discursos no último sábado (1º). Eles não trataram especificamente das decisões monocráticas, mas o tema está em pauta no Congresso.
As leis sobre as ações de controle de constitucionalidade, chamadas de ADI e ADPF, foram aprovadas pelo Congresso em 1999. Elas surgiram como projeto de um grupo de juristas, cujo relator era o professor Gilmar Mendes.
Regras para Concessão de Liminares
A legislação define regras para a concessão de medidas cautelares nessas ações - uma espécie de análise provisória e urgente do processo. Pelo texto, as liminares das ADIs só podem ser decididas por maioria absoluta do Supremo (seis ministros) ou individualmente pelo presidente da corte durante o recesso do Judiciário.
Para as ADPFs, a lei define ainda que as liminares podem ser concedidas individualmente pelo relator "em caso de extrema urgência ou perigo de lesão grave ou, ainda, em período de recesso".
Desafios e Mudanças no Regimento
No entanto, em 2009, com Gilmar já presidente do Supremo, integrantes do tribunal passaram a reclamar com frequência da dificuldade em levar seus processos ao plenário. Cada um, então, passou a dar suas liminares.
"É uma distorção, a meu ver. Enquanto eu tive a capa sobre os ombros e assento no Supremo, nos 31 anos em que lá estive, eu nunca atuei substituindo o colegiado. Isso é de um impropriedade marcante: aí vale tudo, é a ótica de cada qual", disse à Folha o ministro aposentado Marco Aurélio Mello.
Marco Aurélio deu 24 decisões monocráticas em ADIs e ADPFs de 2000 a 2021, quando deixou a corte.
Problemas das Decisões Provisórias
O problema criado pela profusão de liminares monocráticas e a falta de espaço no plenário para referendo das decisões foi a permanência por longos períodos de decisões provisórias sem aval dos demais ministros.
O cenário criou distorções. Para o advogado e professor Lenio Streck, o caso mais emblemático foi a ADI dos Royalties. A ministra Cármen Lúcia suspendeu, em 2013, trecho de uma lei e acabou alterando as regras sobre quais estados deveriam receber os valores vindos da exploração de petróleo.
Até hoje, 12 anos depois, a liminar não foi julgada pelo plenário do Supremo. Entretanto, Streck acredita que o problema das decisões monocráticas foi resolvido quando o STF alterou seu regimento interno em 2022 para prever que todas as medidas cautelares seriam levadas automaticamente para julgamento no plenário virtual.
O Papel do Congresso e das Novas Propostas
Não haveria razão, na visão dele, para o Congresso intervir no tema. "Proibir [as decisões monocráticas], zerar o sistema é um problema porque, de algum modo, o Parlamento está entrando numa seara de jurisdição constitucional", afirma o advogado.
Ele ressaltou que o Congresso é um dos principais alvos de ações diretas de inconstitucionalidade, um mecanismo utilizado por partidos e associações para solicitar a derrubada de leis.
"O Parlamento é o maior litigante de controle de constitucionalidade porque as minorias que perdem vão ao Supremo para tentar corrigir aquilo que o Congresso teria feito errado", explica Streck.
Conclusões sobre as Decisões Monocráticas
Quatro ministros do Supremo ouvidos pela Folha concordaram, sob reserva, que a mudança no regimento interno de 2022, construída pela então ministra aposentada Rosa Weber, resolveu o problema das liminares monocráticas de longa duração. Para eles, não há razão para discutir novas alterações sobre o tema.
As liminares individuais no Supremo alcançaram patamares altos em 2020 a 2021, mantendo as monocráticas em mais de 80 por ano, período coincidente com o governo Jair Bolsonaro (PL) e a pandemia da Covid-19.
Em 2024, os ministros do STF concederam 71 liminares monocráticas em ADIs e ADPFs. O recordista é o ministro Flávio Dino, com 21 decisões individuais, das quais 15 foram referendadas pelo plenário e outras seis aguardam julgamento. Há casos em que uma mesma decisão abrange mais de um processo, por tratarem do mesmo assunto.
Interlocutores de Dino destacam que, em todos os processos, o ministro só decidiu após ouvir a PGR (Procuradoria-Geral da República) e as demais partes envolvidas.
Reações do STF e do Congresso
Das 71 decisões monocráticas de 2024, 38 foram levadas ao plenário do Supremo para referendo. Os demais 33 casos ainda não foram julgados, seja por pedidos de vista ou desvios para discussões no plenário físico. Uma das decisões já confirmadas pelo plenário foi a suspensão dos pagamentos das emendas parlamentares.
A decisão gerou uma reação no Congresso, onde o então presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e seus aliados articularam a votação de duas PECs que limitavam os poderes do Supremo. Uma delas tenta proibir decisões monocráticas que suspendam a eficácia de leis ou atos da Presidência da República e do Congresso Nacional. A outra PEC dá poder ao Legislativo de derrubar decisões do Supremo.